quinta-feira, 26 de maio de 2016

Calar jamais, curtir jamais, compartilhar com legenda de denúncia e repugnância.



As redes sociais hoje foram dominadas pelo episódio (terrível) envolvendo a adolescente que fora estuprada por trinta homens. Fotos e videos foram jogadas nas redes pelos próprios malfeitores e posteriormente passaram a ser compartilhada pelos usuários. Eu não vi o vídeo, e nem pretendo ver. Não preciso expor meus olhos a tal agressão para saber que se trata de uma violência e covardia. Também não pretendo compartilhar caso as imagens cheguem até mim. Uma coisa que me chamou muito a atenção foi o fato de muitas pessoas curtirem o compartilhamento. 

Eu confesso que não entendi o que estavam curtindo. Porque não é possível que alguém curta uma garota aparentemente dopada sendo estuprada por vários homens, não entra na minha cabeça que alguém com um mínimo de discernimento possa curtir algo desse tipo. As redes sociais já não é apenas uma ferramenta banal na qual as pessoas se comunicam informalmente e brincam, hoje as redes também são usadas como meio de comunicação, informação e prestação de serviço. E um episódio como esse deve ser tratado com total seriedade. Até acho que o compartilhamento deve ser útil para que a polícia prenda os malfeitores (me recuso a chamá-los de homens. Homem de verdade não faz isso), por outro lado ver pessoas curtindo e pior ainda, comentando de forma pejorativa, agressiva e transferindo para a mulher a responsabilidade pela total brutalidade que estava sofrendo é algo que chega a ser inacreditável. 

Não é possível que em pleno século XXI haja pessoas com uma mentalidade como essa. Então uma mulher não pode mais usar uma mini saia, um short curto? Então todas as mulheres que estiverem na praia com seus biquínis fio dental podem ser estupradas porque ao usarem fio dental estão procurando, estão provocando? Então eu não posso sair com os amigos, tomar uma cerveja e me divertir que posso ser vítima de um malfeitor por eles acharem que estou dando mole? Não vou generalizar, mas o número de homens covardes, estúpidos e que acham que seu poder está no pênis e não no cérebro é cada vez maior, chega a ser assustador.


A violência seja qual for, seja como for, deve ser combatida a ferro e fogo, as nossas leis são brandas demais, não inibe ninguém, e não é mais motivo de impedimento para crimes como esse. Enquanto essas leis não forem revistas, só nos caberá a indignação e a possibilidade de utilizar as redes sociais de forma consciente como forma de protesto e denúncia. 



Tatty Alcantara




Fonte da imagem: https://www.google.com.br/search?q=chega+de+viol%C3%AAncia+contra+a+mulher&rlz=1C1CHZL_pt-BRBR687BR687&espv=2&biw=1366&bih=599&source=lnms&tbm=isch&sa=X&ved=0ahUKEwj4q_bs7vjMAhWMOCYKHb-fBewQ_AUIBigB#imgrc=GfaiWPRfh3LJgM%3A

sábado, 21 de maio de 2016

Um - Uma




Um canto
Um conto
Um tanto
Um pranto
Um santo

Um
Uma

Um verso
Um nexo
Um sexo
Um convexo
Um reflexo

Um
Uma

Uma alegria
Uma euforia
Uma alegoria
Uma sinfonia
Uma ousadia

Um
Uma

Um amigo
Um inimigo
Um alguém
Um ninguém
Um porém

Um
Uma

Uma roupa
Uma rosca
Uma sopa
Uma moça
Uma gota

Um

Uma



Tatty Alcantara

quarta-feira, 18 de maio de 2016

Devaneios VI



Bravas ondas eu velejo
mar aberto sem destino
Só vejo a imensidão
do azul do céu fundindo-se
ao azul das águas infinitas
Para muito além do meu olhar
não sei distinguir o que é céu
e o que é mar


Tatty Alcantara


imagem:https://www.google.com.br/search?q=barco+a+vela&rlz=1C1CHZL_pt-BRBR687BR687&espv=2&biw=1366&bih=599&source=lnms&tbm=isch&sa=X&ved=0ahUKEwiQ8cCOg-TMAhVEkpAKHY8OAwMQ_AUIBigB#imgrc=XitBDgd1W2ZCNM%3A

sábado, 14 de maio de 2016

A carta




Ele desperta ao som do alarme do seu celular, olha para o aparelho e confere: são 5 da matina, senta-se à beira cama, espreguiça-se e boceja. Levanta, faz sua higiene pessoal, toma o café da manhã e vai para o trabalho. No percurso, observa atentamente o movimento frenético das ruas. São centenas de pessoas indo e vindo, carros buzinando, ônibus lotados, cachorros latindo, pedintes por todo lado. Um telão com imagens de futebol o chama a atenção. Apressa o passo e atravessa a rua numa velocidade digna de um velocista.

Sua rotina é pesada, durante seu expediente não para um minuto sequer e na hora do almoço, come com a mesma rapidez com que atravessa a rua. Ao final do dia, Ele segue o caminho de volta para casa. Ao adentrar a sala, abre as janelas, tira os sapatos e joga-se no sofá. Pega o controle remoto e passeia pelos canais de TV, vê um pouco de notícia, reclama do preço do gás e da energia, coloca no canal de esportes para ver os comentários da última rodada do campeonato brasileiro, come, toma banho e em seguida vai dormir.

Ele tem essa rotina todos os dias, exatamente nesta mesma sequência, nada muda, e qualquer possibilidade de algo diferente disso é motivo de pânico. A rotina é a certeza de que nada em sua vida pode dar errado ou acabar com sua tranquilidade.

No prédio onde mora, Ele entra e sai sem falar com ninguém e apenas dirige-se ao porteiro quando pergunta se tem alguma correspondência para o seu endereço. Ele sempre recebe uma carta, toda semana, no mesmo dia. E nesse dia não havia correspondência. Estranhou.

Franziu a testa, pediu que o porteiro olhasse mais uma vez, mas constatou-se que de fato não havia nenhuma carta. Subiu ao apartamento com um ar de que algo muito ruim poderia ter acontecido. Alguns minutos depois, o porteiro toca sua campainha, pede desculpas, diz que se equivocou e entrega-lhe a carta.

Na manhã seguinte ao passar pelo porteiro, percebe um olhar estranho e uma risada tímida, louca para explodir. – Será que ele leu a minha carta? Indaga-se. E passa o dia com aquilo na cabeça. As semanas foram passando e os risos cada vez mais aumentando. Ele estava incomodado.

Dias se passaram até que numa determinada manhã, alguns moradores fizeram queixa de que algo não cheirava bem na garagem do prédio. O sindico e mais alguns moradores foram verificar e ficaram atônitos ao acharem o corpo do porteiro dentro de uma sala de ferramentas. Chamaram a polícia.

Foram dias e mais dias de investigação, Ele estava alheio aos acontecimentos e seguia sua rotina como se nada tivesse acontecido até que numa determinada manhã sua campainha toca, o policial que estava fazendo as investigações diz que precisa fazer algumas perguntas. Ele convida o policial para entrar. Após muitas perguntas, todas com respostas negativas, ao despedir-se, o policial nota um envelope sob a mesa. – Recebe carta com frequência? – Sim, respondeu ele.

O policial aproxima-se do envelope, nota que a carta estava em branco e que apenas o envelope continha o nome e o endereço do destinatário. Indaga-o: - No dia do sumiço do porteiro, uma das crianças que brincava no play, disse-me que ele havia subido para lhe entregar uma correspondência. O senhor provavelmente foi a última pessoa a falar com ele.

– Eu o matei.
- O senhor o matou? O senhor está de dizendo que matou o porteiro?
- Sim, eu o matei.
- O Senhor o matou por qual motivo?
- Ele lia minhas correspondências.
- E o que é que tinha nas suas correspondências para o senhor tê-lo matado?
Ele entrega as cartas e o policial percebe que todas estava em branco.
- O senhor recebe cartas em branco?
- Sim recebo.
- Mas então o senhor José não leu suas cartas, não havia o que ler?
- Sim havia, ele leu, leu todas as cartas, ele abria o envelope, fechava novamente e me entregava. Todas as cartas, toda semana.
- Mas não havia nada descrito, eram só folhas em branco!
- Isso mesmo, eram só folhas em branco.

E seguiu algemado para a delegacia sob os gritos de assassino dos demais moradores do prédio.




Por Tatiane Alcantara

terça-feira, 10 de maio de 2016

Nesse angu tem muito caroço


Nesse angu tem muito caroço
e caroço de todo tipo
Tem o que manda e o que desmanda
O que diz e desdiz
O faz e desfaz
E o que tanto faz

Nesse angu tem muito caroço
Tem um Maranhão que não é o Maranhão
Que entrou pelos fundilhos
Temendo a repercussão
De sua infeliz
revogação

Nesse angu tem muito caroço
tem um parlamento doente
que não pensa na gente
Nessa gente que neles votaram
e que neles novamente votarão
infelizmente

Nesse angu tem muito caroço
Esse ano tem eleição
Deveria ser o ano que o povo
poderia diminuir os caroços
desse angu chamado corrupção
e deixar de dar o seu voto
em troca de qualquer grão

Tatty Alcantara

sábado, 7 de maio de 2016

A detração – breve ensaio sobre o maldizer - Uma breve constatação



A detração – breve ensaio sobre o maldizer


Tatiane Alcantara Silva[1]


KARNAL, Leandro, 1963 - A detração: breve ensaio sobre o maldizer – São Leolpodo: Ed. UNISINOS, 2016.


Em A detração – breve ensaio sobre o maldizer, Leandro Karnal apresenta em 102 páginas, uma reflexão história, religiosa e filosófica sobre o hábito de falar mal dos outros, como aponta o próprio autor. A escolha da palavra detração é bem interessante na medida em que não é usada habitualmente. Detração é uma palavra do gênero substantivo feminino, que no Houaiss encontramos apenas o verbo transitivo detratar (depreciar, desvalorizar), ou detrator (quem detrata). Na consulta VOLP, designa apenas como s.f., ou seja, substantivo feminino. Detração pode ainda significar: depreciação, menosprezo, uma expressão maledicente ou difamação.

Tanto Detração quanto maldizer, são palavras que de forma não muito popular, designa o ato de fofocar. A fofoca sim, é conhecida no uso habitual da língua portuguesa. A prática da fofoca é notável em qualquer lugar, seja cidade, comunidade, numa determinada cultura, em ambientes rurais, em linguagens informais e também formais, em ambientes refinados e em grupos sociais distintos. A fofoca está em todo lugar. O ato de detratar alguém, só é agradável por motivos óbvios ao detrator, este por sua vez, sente uma espécie de ânimo, uma alegria inexplicável, beirando ao sadismo.

Na maioria das vezes a fofoca é algo impensado, a pessoa preocupa-se apenas em maldizer o outro, sem pensar na veracidade dos fatos e nas possíveis consequências que quase sempre são devastadoras e irreparáveis para quem sofre a fofoca.

O autor inicia o livro com um vocativo quando pede que o leitor não pule a brevíssima introdução, e de fato, é primordial que se faça a leitura da introdução, pois é nela que Karnal discorre sobre os significados das palavras e de que forma vai apresentar seu breve ensaio sobre o maldizer.

Karnal faz um passeio sobre a detração ou ato de fofocar através da história, da política, da religião e do preconceito. É uma leitura dinâmica, leve e em muitos momentos bem-humorada. Na medida em que a leitura avança, o leitor é levado a inúmeras reflexões, situações diversas vão aparecendo e revelam ao leitor o quanto ele pode ser fofoqueiro, e o quanto possivelmente já tenha feito mal a alguém, assim, nos revela de forma interessante que de agora em diante é necessário ter cuidado no trato das palavras e daquilo que se profere sobre algo ou alguém, obviamente que isso só é possível ao leitor que se dispõe a apontar o dedo para si.




[1] Formada em Letras com Habilitação em Língua Inglesa e respectivas Literaturas pelo Centro Universitário Jorge Amado – Salvador/BA.





Fonte da imagem da capa: http://www.edunisinos.com.br/