domingo, 31 de julho de 2016

Selfie a todo custo



O homem está acabando com o homem e diminuindo gradativamente a humanidade nossa de cada dia. O homem cada vez mais torna-se perverso, capaz de verdadeiras atrocidades. Cada um querendo ser o centro de todas as coisas, esquecendo de dar lugar ao próximo, de estender a mão ao próximo, de se indignar pelo outro, de demonstrar compaixão aos seus semelhantes. O homem está perdendo a capacidade de ter compaixão.
A cada hora, somos surpreendidos com notícias sobre atentados terroristas, mortes por crimes passional, morte no trânsito, assaltos em ônibus, morte de todo jeito. As estatísticas estão aí para mostrar o quanto a morte passou a ser algo corriqueiro, banal, é notícia certa em qualquer telejornal, estes por sua vez, alimentam-se ferozmente de toda tragédia ou morte anunciada.
O homem está perdendo completamente o senso de humanidade. Em um dos desfiles da tocha olímpica, duas motos da polícia se chocam e os policiais caem um sobre o outro, um homem para e tira uma selfie, faz tudo para não perder o ângulo da foto, os dois policiais caídos, machucados e com as motos caídas e ele só se preocupou em fazer uma selfie. Não se passou pela cabeça desse cidadão socorrer os policiais? Não. Ele se preocupou em registrar a foto. Ele foi capaz de cometer uma barbaridade contra a sua própria espécie, resquício de uma sociedade doentia onde uma imagem vale mais que um gesto de humanidade.

É bem verdade que outras pessoas foram socorrer, o que mostra que não estamos de todo perdidos. Ainda.

sábado, 23 de julho de 2016

Série - Provérbios de Carolina - II






Carolina Maria de Jesus era negra, pobre, favelada, semianalfabeta e possuía conhecimento de mundo. Era dotada de uma sapiência invejável. Trabalha duro para não deixar faltar ao menos o pão para seus três filhos. 
A fome para ela era sua escravatura atual. 
Não se deixava derrotar. 
Não era indolente. 




terça-feira, 19 de julho de 2016

Na fila do supermercado

A tia, já com a coluna curvada, possivelmente pela sua idade avançada e provavelmente por ter carregado muito peso, lenço na cabeça... 
No rosto já marcado pela idade, a expressão de uma vida sofrida. Ela é conhecida por todos no bairro pois tem uma barraquinha de folhas e temperos. É o seu ganha pão. Seu comércio.
Na fila do supermercado, a percebo atrás de mim e peço que passe em minha frente, afinal sua idade já não permite mais pegar nenhum tipo de fila. Ela sorri e agradece. Em sua mão 4 laranjas lima.
No caixa:
- São R$ 2,70
- O quê minha filha?
- São R$ 2,70 tia.
- Mas tudo isso minha filha, 4 limas custa tudo isso?
- Lima é mais caro tia.
- Mas tudo isso? Danou-se. Vou ficar sem merendar!
Ela fica parada sem querer acreditar que não vai levar as limas.
Ofereço-me para pagar. Ela me olha espantada e diz: ôh minha filha é mesmo é? - É sim tia. E peço à moça do caixa para registrar junto com meus produtos.
Ela sorri, deseja-me que eu tenha uma vida abastada e abençoada e que eu receba em dobro. Insiste para que eu vá à sua barraca para pegar um pacotinho de pimenta cominho.
- É a melhor pimenta cominho do bairro minha filha, vem do interior.
Agradeço a benção e digo que não é necessário ela me dar o cominho.
- Mas é dando que se recebe minha filha.
- Já recebi sua benção, isso me basta.
- Então que Deus te abençoe mais ainda.
- Amém. Respondo. E que abençoe a senhora também.

Ela vai caminhado devagar e reclamando do preço da laranja lima. 
– É o fim do mundo, onde já se viu, 4 limas por R$ 2,70. Com esse valor eu compro é uma saca no interior, cidade grande é tudo caro! 




Por Tatty Alcantara

domingo, 10 de julho de 2016

Série - Provérbios de Carolina - I






Carolina Maria de Jesus (1914/1977). Nasceu em Minas Gerais e mudou-se para São Paulo em 1947 onde passou a viver na favela do Canindé. Trabalhava como catadora de papelão e ferros. Tinha três filhos e os sustentava de tudo que ela achava no lixo e vendia. Nas horas vagas registrava o cotidiano da comunidade em cadernos que encontrava no lixo.  Foi descoberta pelo jornalista  Audálio Dantas quando ele foi à favela para fazer uma reportagem, Descobriu sua reportagem em mais de vinte cadernos escritos por Carolina. Ficou conhecia por sua obra Quarto de Despejo - relato diário de tudo que acontecia e viva na favela.
A escrita de Carolina é carregada de dor e sofrimento ao mesmo tempo que se revela uma pessoa esperançosa por vida mais digna. Semi-analfabeta, Carolina mostra enorme sabedoria adquirida ao longo da vida sofrida e das leituras de livros, revistas e jornais que pegava no lixo ou ganhava. 
Em Quarto de Despejo a escrita de Carolina foi mantida, inclusive com seus erros de ortografia e concordância, o que não diminuiu em nada a riqueza de seus escritos, pois é desta forma, que percebemos que apesar de não ter tido estudo, possuía conhecimento de mundo, e enorme sapiência em utilizar as figuras de linguagem e pensamento. 

Carolina possui 6 obras:

1960 - Quarto de Despejo
1961 - Casa de Alvenaria
1963 - Pedaços de Fome
1963 - Provérbios 
1986 - Diário de Bitita
1996 - Antologia Pessoal

Ainda não li todos livros de Carolina, pois a conheço há pouco tempo. Li Quarto de Despejo, Provérbios e estou lendo Casa de Alvenaria. Pretendo ler todos. 
Carolina Maria ainda é pouco conhecia, embora sua obra já tenha sido traduzidas para mais de dez línguas. 
Carolina a meu ver, é essencial, é fundamental, é primordial e deveria ser muito lida, e discutida. 
Tomara que isso um dia aconteça.

Aqui no blog estarei publicando alguns provérbios de Carolina Maria de Jesus na Série - Provérbios de Carolina.


Por Tatty Alcantara